8 . Pares
Redes sociais, televisivas, revistas, jornais, grupos virtuais, todos discutem a igualdade de gênero, a construção de identidade, o respeito às escolhas sexuais.
Eu, porém, acho que a discussão deveria ser outra: deveríamos discutir os pares, não importando os gêneros que os estabelecem.
As dúvidas, medos, ciúmes, submissões se fazem tanto em pares hétero como em pares homossexuais: a submissão ao sexo implicando também a submissão da vida, da vontade, do pensamento, a luta pela igualdade desaparecendo entre as quatro paredes. Conheci um casal homo em que um deles exercia o tradicional e tão questionado papel feminino – permanecendo em casa a cozinhar, limpar, lavar, passar –, enquanto seu parceiro saía para trabalhar.
Com relação ainda à submissão, observo que as relações se deterioram em função de uma causa única: o desrespeito à individualidade do outro, aí incluídas as ausências e as omissões. As mágoas mais fundas se instalam, não por uma ofensa real, determinada, mas pela ironia, pela negação daquilo que o outro é ou representa.
Passado o encanto inicial, começa o processo de amálgama: o outro sou eu, eu sou o outro; almas gêmeas; meu espelho; metade que me completa. Como se isso fosse possível! Ninguém é metade de outro alguém. Somos todos inteiros, sujeitos de nós mesmos.
As decisões tomadas isoladamente para serem cumpridas com o outro podem parecer desrespeito e quase sempre são por ele assim sentidas. Ceder por vontade própria pode ser um recurso ocasional para o bem-viver. Ceder sempre é submissão e implica despersonalização. Quem quer diluir-se para o outro ser feliz? Isso é doença, masoquismo, e de ninguém pode ser exigido. É um preço muito alto para uma paz aparente.
Nesse processo, assim como acontece com uma infiltração na parede do banheiro, a mancha da dúvida, da autoproteção, do protesto, começa a se formar. Demora às vezes a aparecer, cresce oculta pelos adereços, mas acaba por revelar-se e apresentar-se à luz.
“Mas eu amo tanto!”
É mesmo?! Você pensa realmente que isso é amor?